Opinião

Não é pelos 20 centavos

Por Eduardo Caputo
Pesquisador associado - Universidade Brown, EUA
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Não, esse não é um texto de protesto! Fique tranquilo! É apenas mais uma comparação (complexa, eu sei), entre países desenvolvidos (ou de alta renda, se você preferir) e o Brasil (país de renda média-alta). Por mais que tais comparações sejam difíceis de serem feitas, por vários motivos, julgo que entender outros panoramas é algo importante. Não faz muito tempo os noticiários estavam repletos de cenas de protestos de trabalhadores na França. Pois bem, eu tive a oportunidade de acompanhar, in loco, protestos tanto na Austrália, quanto nos Estados Unidos. Sim, na terra do Tio Sam, onde todo mundo acha que a vida é maravilhosa, a ponto da uma novela romantizar a entrada ilegal no país.

Em Sydney, acompanhei dois protestos. O primeiro, de funcionários do sistema de ensino, que paralisaram as atividades em virtude de melhores condições salariais. Se reuniram na entrada do campus central da Universidade, e ficaram ali com seus cartazes, chamando atenção da população sobre o que acontecia. O segundo, de funcionários da empresa responsável pelos trens na cidade, novamente por não haver acordo entre os mesmos e o governo em relação ao aumento de salários. Trazendo para realidade brasileira, pode-se comparar com os protestos dos motoristas de ônibus quando tentam aumento. A diferença?! A companhia avisou por meio de todas as mídias possíveis que haveria alteração no horário do transporte público, mas que apesar dos protestos a população não ficaria desassistida. Havia trens funcionando, com horários alterados. Tabelas com horários de cancelamento, em especial nas estações principais, divulgadas para que as pessoas conseguissem planejar seu dia. Ou seja, sem prejudicar em 100% quem mais depende do sistema: a população.

Em Providence há várias instituições de ensino superior. Além da Brown, onde trabalho, e que é eventualmente citada em filmes e séries, há a Escola de Design de Rhode Island. Escola importante, que possui um museu reconhecido no país. Pois, eis que em uma negociação salarial, os funcionários desta escola resolveram parar, pois não se sentiram contemplados ao longo das negociações. Diariamente eu passava em uma das ruas laterais da escola, que fica em uma região central da cidade, e acompanhava os protestos. Várias pessoas na calçada, com apitos e instrumentos musicais, colando cartazes pelos prédios da vizinhança com os dizeres "Vamos lutar juntos".

Protestar é algo natural, quando nós achamos que algo está errado, ou se estamos sendo prejudicados de certa forma. Porém, as diferenças na forma de protestar que tive a oportunidade de ver in loco, fora do Brasil, em comparação com os ocorridos por aqui, dizem muito sobre nossa estrutura de sociedade. Não há bala de borracha, correria, e muito menos vidros quebrados. Ainda, não há nenhum tipo de depredação de patrimônio público. A polícia não está lá para reprimir os protestos, e dispersar, e sim para evitar que haja qualquer tipo de intercorrência. Como disse no início, tais comparações entre países de culturas diferentes são complexas, mas isso não impede que possamos repensar algumas coisas como sociedade, com base em bons exemplos.

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